Tenho raiva da minha sogra, um caso sistêmico
- Ana Paula Klein

- 9 de mai. de 2018
- 3 min de leitura

Uma jovem, trinta e poucos anos, coloca sua questão: não gosto da minha sogra, ela me incomoda. É casada há 10 anos, não tem filhos, ambos no primeiro casamento. Peço que ela mesma se posicione (Tainá) e escolha um representante para o marido (Kauã)*. Eles se olham, há muito afeto, se aproximam. Coloco uma representante para a sogra. Tainá direciona seu olhar para a sogra com desprezo, seu marido não olha para a mãe. Tainá diz que a sogra tem preferência pelo outro filho, seu cunhado. O julgamento aparece e com ele a dinâmica sistêmica por trás do sentimento.
Kauã não olha para a mãe e se mostra indiferente com a situação. Peço que Tainá diga ao marido: "por amor, quero cuidar de você". Ela se emociona. Peço para dizer: "sinto raiva da sua mãe... faço por você". Se emociona muito, chora, e começa a reconhecer o lugar que ocupa. Essas falas reverberam no campo e Kauã direciona o olhar e o corpo para a mãe. Fica visível que Tainá "assumiu" a dor do marido, e ao reconhecer que estava ocupando um lugar que não era seu, abre-se um espaço para que seu companheiro assuma suas próprias questões.
Incluo os pais de Tainá, ela se direciona à eles e se aproxima. Olha para a mãe e a abraça. Há um reencontro (sua mãe faleceu cedo). Depois se direciona ao pai (foi alcoolista, é bipolar, se preocupa constantemente com ele, porém a relação é distante) e diz: "quis salvar você... agora vejo que eu não posso... sou a pequena". O abraça, aceita, e recebe a força da vida. Esse movimento reverbera novamente no campo e seu companheiro consegue se aproximar um pouco mais da mãe.
Peço para que diga ao marido: "deixo com você o que é seu". E à sogra: "julguei você..... agora vejo que ocupei um lugar que não era meu, eu sinto muito".
Bert Hellinger identificou que há um funcionamento sistêmico em relação as "ordens da ajuda". Quando desejamos ajudar o outro, sem que o outro precise, podemos, mesmo com uma "boa intenção" nos colocar como maiores e melhores que o outro. Há uma crença de que o outro não é capaz de suportar seus pesos/destinos, e o ajudante resolve então assumir pelo outro questões que não são suas. Essa dinâmica, ao invés de ajudar, atrapalha... o ajudante acaba impedindo que a outra pessoa reconheça e assuma suas próprias dinâmicas/padrões. Movimento fundamental para o processo de transformação.
Nas palavras de Hellinger (2005): "Para muitos ajudantes pode ser que o destino do outro pareça ser difícil e por isso querem mudá-lo. Entretanto, muitas vezes, não porque o outro precise ou queira, mas porque os próprios ajudantes não conseguem suportar esse destino. E quando o outro, mesmo assim, se deixa ajudar por eles, não é tanto porque precise disso, mas porque deseja ajudar o ajudante. Então, essa ajuda se torna tomar e o tomar a ajuda, doar" (p.15).
Essa Constelação Familiar explicitou uma dinâmica frequente na relação de cuidado com familiares. Por amor, e sem consciência do lugar que estava ocupando, Tainá assumiu a dor que o marido sente na relação com a mãe expressando-a através da raiva e incômodo que sente pela sogra. Reproduziu com o companheiro um padrão já conhecido por ela: querer ajudar/salvar o próprio pai. Dar um passo para trás e deixar que o marido assuma suas dores e dificuldades é o caminho da libertação....
Este texto foi lido pela cliente e autorizado para divulgação.
*nomes fictícios
Referências:
Hellinger B. (2005). Ordens da Ajuda. Patos de Minas: Atman.



